Uma
mosquinha de dúvida costuma sussurrar em nossos ouvidos, quando,
como é comum em textos jurídicos, temos que escrever palavras como
“não contradição”, “não cumprimento”, entre tantas outras
antecedidas por não.
Segundo
o Acordo Ortográfico de 1990, “Não se emprega o hífen com as
palavras não e quase
com função prefixal: não agressão, não beligerante, não
fumante, não periódico, não violência, não
participação; quase delito, quase domicílio, quase equilíbrio,
etc.” (Adendo 1, Base XVI).
Os
dicionários Houaiss e Aurélio acolhem a decisão consignada no
Acordo e registram sem hífen as palavras antecedidas por não.
Mas essa regra não foi acatada por todos os dicionários nem por
todos os estudiosos e produtores de conteúdo sobre língua
portuguesa (manuais, blogs). O dicionário on-line Priberam,
de origem lusitana, registra, por exemplo, “não agressão”, mas
apresenta nota sobre a grafia em Portugal, que permanece com hífen.
Uma simples pesquisa no Google pode levar o pobre redator para uma
miríade de argumentos contra e pró hífen. E quase todos muito bem
fundamentados. O que fazer, então?
Todos
temos nossas pedras no meio do caminho. O hífen é certamente uma
das grandes, mas não incontornáveis. Se estamos em um ambiente
institucional, melhor usar o que é mais oficial. Assim, evite o
hífen em palavras inciadas por não. Problema
resolvido. Na hora da dúvida, é só cortar o hífen. Lembremo-nos
de que os textos oficiais devem seguir o padrão ortográfico. Somos
referência, por isso devemos evitar as variações estilísticas.
Mas…
Sempre tem um “mas” para nos fazer pensar.
Em
“Nota explicativa”, a Comissão de Lexicologia e Lexicografia da
Academia Brasileira de Letras – ABL, na edição de 2009 do VOLP
(Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa), traz o seguinte
comentário:
Está
claro que, para atender a especiais situações de expressividade
estilística com a utilização de recursos ortográficos, se pode
recorrer ao emprego do hífen nestes e em todos os outros casos que o
uso permitir. É recurso a que se socorrem muitas línguas. Deste não
hifenado se serviram no alemão Fichte e Hegel para exercer
importante função significativa nas respectivas terminologias
filosóficas: nicht-sein e nicht-ich, de que outros idiomas europeus
se apropriaram como calcos linguísticos. Não é, portanto, recurso
para ser banalizado.
Ora,
se o espírito do Acordo visa à simplificação, parece-nos natural
que os sinais diacríticos (sinais gráficos) sejam mais restritos,
mas isso está longe de uma proibição de uso. Não podemos nos
esquecer que, fora das amarras formais, tudo pode ser experimentado
criativamente na língua ou mantido historicamente. Por exemplo, quem
trata de temas filosóficos dificilmente vai se permitir escrever
“não-ser” sem hífen, apesar da sugestão da ABL. Afinal, esse é
um registro com força semântica inegável e profundamente ligado a
um conceito filosófico claro e que se replica em outras línguas.
Guardemos também que o hífen “não é, portanto, recurso para ser
banalizado”. Bom é que o texto seja claro. Eis o nosso objetivo!
Até
a próxima!
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