segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Infinitivo impessoal

“Viver é um descuido prosseguido”, disse Riobaldo pelas mãos de Rosa. A força dessa frase está certamente na forma poética e mínima com que Rosa constrói o pensamento. Menos é mais, e em Rosa é sempre muito mais. A substância da vida é viver, e o viver é um movimento simples e constante.

A ideia do autor se materializa na simplicidade do uso de um verbo na função de um substantivo. Viver está no infinitivo. Não há nele as certezas do indicativo nem as dúvidas do subjuntivo. É só um verbo a espera de um agente, assim como a vida. Então, falemos um pouco desse verbo sem flexão, sem o agir (olha aí um outro verbo se transubstanciando!).

Como tudo é simplicidade e prosseguimento, apresentamos cinco situações em que o infinitivo não é flexionado:

1. quando não se refere a sujeito:

Viver é muito perigoso” (G. Rosa)

Amar, verbo intransitivo” (M. Andrade)

2. quando há sentido narrativo ou descritivo (Celso Cunha denomina infinitivo de narração)

A sorrir eu pretendo levar a vida”. (Cartola)

3. quando precedido pelas expressões fácil de, possível de, bom de, raro de:

Pensamentos humanistas devem ser fáceis de aceitar.

4. quando pertence a uma locução verbal:

Os juízes vão julgar com isenção os casos que se apresentam.

5. quando depende dos verbos causativos deixar, mandar, fazer e sinônimos ou dos verbos sensitivos ver, ouvir, sentir e sinônimos e se o complemento for um pronome oblíquo:

Deixei-os fazer a lição amanhã.

Atenção! Se no lugar de “os” tivéssemos “os meninos”, flexionamos o infinitivo. Assim:

Deixei os meninos fazerem a lição amanhã.

Atenção! Se houver um sujeito entre o auxiliar e o infinitivo, este flexiona-se. Assim, temos:

Sentia as lágrimas de emoção inundarem-lhe os olhos.

É bom lembrar que aqui trouxemos as opiniões mais comuns sobre infinitivo flexionado ou não. Há sempre um outro que discorda, mas, como diz o próprio Rosa a “natureza da gente não cabe em nenhuma certeza”. E talvez a incerteza seja um pouco de sabedoria!

Até a próxima!

Fontes básicas:
ALMEIDA, Napoleão Mendes de Almeida. Dicionário de questões vernáculas. 4ª ed. São Paulo: Ática, 2005.
BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa. 37ª ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.
CUNHA, Celso & CINTRA, Lindley. Nova Gramática do Português Contemporâneo. 5ª ed. Rio de Janeiro: Lexikon, 2008.
ROSA, Guimarães. Grande Sertão Veredas. 20ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.

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