quarta-feira, 6 de setembro de 2017

Gerúndio e a vírgula (II)

Em nossa língua tem sido comum o uso do gerúndio encabeçando orações com sentido de modo, meio ou instrumento. Observem o exemplo abaixo extraído da Lei Complementar n. 150/2015.

O salário-hora normal, em caso de empregado mensalista, será obtido dividindo-se o salário mensal por 220 (duzentas e vinte) horas, salvo se o contrato estipular jornada mensal inferior que resulte em divisor diverso. (art. 2º, § 2º)

No trecho destacado não há vírgula antes do gerúndio. Isso ocorre porque, nesse caso, o gerúndio tem papel adverbial, que indica o modo como se dá a ação. Para perceber mais claramente essa função adverbial, basta observar se é possível responder à pergunta como?, cuja resposta, no exemplo, será: dividindo-se o salário mensal por 220 horas. Quando essa pergunta faz sentido, o gerúndio não deve ser separado por vírgula.

Lembremos daquela lição sobre a ordem direta na língua portuguesa: sujeito (S) + verbo (V) + objeto (O) + circunstância/advérbio. Sabemos que, se a circunstância (ou advérbio) está no fim da oração, a vírgula não será necessária. Vejam que ótimo: isso vale para o gerúndio quando ele está nessa função. Viu como a língua não é tão sem lógica como afirmam os mais indignados!

O pulo do gato está em lembrar-se também de que, se a circunstância aparece deslocada ou intercalada, a vírgula será obrigatória porque a ordem SVO+C foi alterada. Assim, teríamos:

Dividindo-se o salário mensal por 220 (duzentas e vinte) horas, será obtido o salário-hora normal, em caso de empregado mensalista.

Vamos ao segundo exemplo, também extraído da Lei Complementar 150/2015.

Em relação ao empregado responsável por acompanhar o empregador prestando serviços em viagem, serão consideradas apenas as horas efetivamente trabalhadas no período (…), podendo ser compensadas as horas extraordinárias em outro dia, observado o art. 2º. (art. 11)

Façamos a pergunta: acompanhar o empregador como? Prestando serviços em viagem. Vejam que prestando serviços em viagem é o modo ou meio como o empregado acompanha o empregador. Mais uma vez a circunstância aparece no final, depois do verbo e do objeto, portanto não há necessidade de vírgula.

É interessante notar que o art. 2º da LC 150/2015 apresenta outras orações, que se unem para formar um sentido maior. Ali no final temos um outro gerúndio, que não responde à pergunta como? Trata-se de situação similar à discutida na coluna anterior, em que o gerúndio funciona como aditiva. Situação também em que a vírgula é obrigatória.

O conselho é: não tema o gerúndio. Use-o com cuidado e parcimônia. Escrever é construção, quanto mais cuidadosa a junção das peças menos possibilidades de que o texto desmorone.


Até a próxima!

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